
A Câmara dos Deputados aprovou nesta semana, por 315 votos a favor e 143 contra, uma resolução que suspende a ação penal do Supremo Tribunal Federal (STF) contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Bolsonaro. A decisão gerou forte repercussão e abriu mais um capítulo de tensão institucional entre os poderes Legislativo e Judiciário.
Ramagem, que já foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e se tornou réu no STF, é acusado de participação ativa na tentativa de golpe de Estado que culminou nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. A PGR o identifica como integrante do núcleo central da trama golpista.
Apesar da gravidade das acusações, a votação que favoreceu Ramagem foi conduzida com rapidez. Já na abertura da sessão, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), deixou claro que não admitiria requerimentos de adiamento, emendas ou destaques. Após a aprovação, ele promulgou a resolução imediatamente, tornando a suspensão da ação penal efetiva.
Base constitucional ou afronta institucional?
A justificativa da Câmara se apoia no artigo 53 da Constituição Federal, que permite ao Congresso suspender ações penais contra parlamentares por crimes cometidos no exercício do mandato. No entanto, o STF já havia estabelecido que esse entendimento não se aplicava integralmente ao caso de Ramagem.
Segundo o Supremo, a suspensão da ação só poderia atingir dois dos cinco crimes pelos quais ele é acusado — dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado — ambos relacionados aos atos de 8 de janeiro. Os demais, incluindo tentativa de golpe de Estado, organização criminosa e tentativa de abolição violenta do Estado de Direito, ocorreram antes do mandato e, portanto, deveriam continuar tramitando normalmente.
Para o líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (RJ), a decisão representa uma grave distorção constitucional. "A Câmara optou por uma decisão completamente inconstitucional, inócua, mas o recado é muito ruim. É criar uma crise institucional", afirmou, anunciando que a bancada recorrerá ao Judiciário.
Votação dividida entre oposição e base
A base bolsonarista, composta por PL, Republicanos, Novo, Podemos e PRD, votou de forma unânime pela suspensão da ação penal. Todos os deputados do PT, PCdoB, PV, PSOL e Rede se opuseram. No entanto, a proposta recebeu apoio até mesmo de parte da base governista, o que evidencia divisões internas e a complexidade do cenário político atual.
Em nota, Ramagem defendeu a suspensão como uma prerrogativa parlamentar amparada na Constituição. No entanto, para juristas e analistas, a decisão da Câmara escancara os limites da chamada "autoproteção legislativa" e reacende o debate sobre impunidade entre parlamentares acusados de crimes graves.
Com a medida já em vigor, o desfecho agora dependerá da resposta do Supremo Tribunal Federal, que poderá reverter ou modular os efeitos da resolução aprovada. Enquanto isso, o país assiste a mais um episódio de tensão entre poderes, colocando em xeque o equilíbrio institucional previsto pela Constituição.